Fyodor Lukyanov
Presença da Rússia na Ásia e no Pacífico é fundamental
Disputas locais entre os países do Pacífico estão rapidamente se transformando em um problema global
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Quando Dmitri Medvedev visitou as Ilhas Curilas, primeiro como presidente e depois como primeiro-ministro, os comentaristas internacionais denunciaram a Rússia por sua conduta sem tato e ambições imperiais, uma vez que o Japão considera estas ilhas como os seus Territórios do Norte. Recentemente, o Presidente da Coreia do Sul, Lee Myung-bak, fez um movimento semelhante quando realizou sua primeira visita a uma ilha reivindicada por Tóquio, causando tensões entre os dois países.
Aparentemente, tudo depende do ponto de vista de cada pessoa. Disputas territoriais têm sido motivo de constantes e frequentes discussões na Ásia. Além de Tóquio e Seul, Tóquio e Pequim também estão em desacordo. Nacionalistas do Japão e da China brigam por uma ilha, o que provoca protestos entre os dois países. A China enfrenta problemas também com as Filipinas justamente por disputa territorial. O número total de disputas territoriais no Leste e Sudeste da Ásia está na casa dos dois dígitos. A discórdia russo-japonesa é apenas um pequeno pedaço do complexo mosaico das relações regionais, que se estendem ao longo da história euroasiática.
Todos esses conflitos são antigos. Eles estão no centro das atenções agora porque a região Ásia-Pacífico tornou-se o centro de eventos globais e é considerada a principal arena estratégica do século 21. Ironicamente, muitos desses conflitos duradouros remontam à época em que aqueles países não tinham a importância de hoje perante o cenário global.
Após a II Guerra Mundial, as grandes potências eram muito meticulosas na negociação dos limites do que era permitido possuir na Europa. Isso se aplica à delimitação de fronteiras também. Ficou claro que, se algumas fronteiras permaneceram vagas ou disputadas, isto conduziria, inevitavelmente, a um grande conflito, e qualquer escalada na era do impasse Estados Unidos–União Soviética poderia ser fatal. Em princípio, as mesmas regras do jogo também se aplicam para a Ásia, mas, na época, a região não era tão importante quanto a Europa e todos os problemas eram resolvidos com menos cautelas.
Como resultado, a Ásia está agora envolvida em uma série de conflitos. Anteriormente, eles foram congelados pela influência estabilizadora dos confrontos latentes durante a Guerra Fria totalmente ideológica. Com o fim da Guerra Fria, os pontos de vista sobre a região da Ásia e do Pacífico avançaram e, nos dias atuais, pode-se dizer que a região é essencialmente alavancada pelos interesses econômicos.
Afinidades ideológicas já não importam tanto. O pragmatismo tomou conta da região e hoje, mesmo sendo féis aliados dos Estados Unidos, não se pode dizer que Japão e Coreia do Sul tenham afinidade ideológica total com aquele país. Outro exemplo do pragmatismo que domina a região asiática: tidos como oponentes políticos e até mesmo como inimigos, Seul e Pyongyang, têm um interesse comum, já que a Coreia do Sul e a Coreia do Norte não simpatizam com a ideia do Japão ser o principal ator político da região. Mas, além, do Japão, há um fator de risco ainda maior para as duas Coreias e para o próprio Japão: o crescimento da China.
Disputas locais entre os países do Pacífico estão rapidamente se transformando em um problema global porque os Estados Unidos, a superpotência mundial não pode deixar de se envolver com eles. A China está envolvida na maioria dos conflitos e, portanto, seus oponentes sabem que podem contar com o apoio dos Estados Unidos. Para Washington, a decisão de apoiá-los será um reflexo de seu status global. Afinal, os Estados Unidos precisam provar ao mundo que ainda são a grande influência global.
À luz de todas estas mudanças, a Rússia não pode, simplesmente, ignorar a sua posição como a potência do Pacífico, e a sua presença na Ásia como o grande jogador da região é vital. A única maneira de alcançar esse status é usar as vantagens de sua posição de transição como uma potência euroasiática. Moscou tem uma oportunidade única de aplicar a experiência europeia de resolução de conflitos para a região Ásia-Pacífico. No século 21, a Ásia pode ter que lidar com os mesmos desafios que a Europa teve de enfrentar no século XX, quando era o centro do mundo. A Rússia pagou um preço alto por esta experiência. E, como parte integrante dos dois continentes, Ásia e Europa, e de ser banhada também pelo Pacífico, a Rússia tem peso político suficiente na Ásia para fazer a diferença.
Para aumentar a sua influência, a Rússia terá de ser muito mais ativa na Ásia e posicionar-se não só em relação à China, mas diante de todo o espectro de interesses e oportunidades na região da Ásia-Pacífico, o que inclui Japão, Coréia do Sul, Coreia do Norte, China, Indonésia, Estados Unidos e, até mesmo, a Austrália.
Uma política proativa e criativa que visa resolver disputas nesta região é o posicionamento que a Rússia deve adotar. Concessões não devem sequer ser cogitadas até porque este é o momento da Rússia mostrar que exerce um papel fundamental e primordial na Ásia e no Pacífico. Para isso, a Rússia pode-se valer da própria experiência europeia da segunda metade do século XX, em que os lados opostos eram capazes de se mover em direção a soluções mutuamente aceitáveis, tudo como forma de evitar novos desastres políticos e econômicos na Ásia e na Europa.